Há uns dias que apareceu sobre a mesa a conversa sobre os 150 Anos do Município do Paul, motivo que nos leva a celebração da sua criação como concelho-uno para a data de 8 de Fevereiro. Só que este 8 de Fevereiro é datado de 1867 perfazendo os tais 150 anos do Paul.

É um "Só que" para mim deveras distante, tão distante que em memória (coisa que me falha e muito) não me recordo de patavina data a ser celebrada lá pelos lados do meu Paul. É um 8 de Fevereiro que me parece ser histórico e da história do nosso Paul. É um 8 de Fevereiro mais para livros do que para o dia-a-dia. É um 8 de Fevereiro tremendamente engolido pelo 13 de Junho. É um 8 de Fevereiro que não me parece ser nem social nem cultural. É um 8 de Fevereiro que é mais carnavalesco do que político. É, muito certamente, um 8 de Fevereiro que fez o Paul mas que não faz do Paul. É, por isso, um 8 de Fevereiro que precede o dia 7 e antecede o dia 9 do mesmo mês, tal como acontece com outros dias, se as datas celebráveis não forem devidamente e bem celebradas. E, infelizmente, este histórico dia 8 de Fevereiro não é nem devidamente nem bem celebrado pelo seu Paul. Resta saber o Porquê?

 

Emigrado Manuel - Estou sim, bom dia Sr. Sem50!

Sem50 - Bom dia, Emigrado Manuel! Como está de lá do Atlântico?

E. Manuel - Olhe, Sr. Sem50, por aqui só frio, tudo gelado, muita neve e pouca fervura! E por lá, que temos feito?

Sem50 - Meu amigo Emigrado Manuel, estamos de festa, a preparar muitas actividades para a celebração do nosso concelho Paul!

E. Manuel - Que bom Sr. Sem50, folgo em saber das boas notícias!

Sem50 - Sabe, Emigrado Manuel, tem de ser não é mesmo! É uma data importante, não a podemos deixar passar em branco!

E. Manuel - Concordo consigo Sr. Sem50. Olhe, por aqui com tanto frio, com tanto gelo, com tanta neve, nem sei como conseguem sair à rua naqueles trajes meio-nus-meio-despidos!?

Sem50 - Bem sei eu, amigo Emigrado! É o espírito da folia, da festa, da celebração. É o povo na sua máxima alegria!

E. Manuel - Pois. Mas por aqui, essa celebração é tudo menos isso. Acho que eles confundem o fado da Amália com o ritmo Sambino, só pode!

Sem50 - Pois, é capaz. Vai "um morna e um coladera" que o Cabo-verdiano lhe mete a seu ritmo! O povo sabe como lhe fazer!

E. Manuel - É verdade Sr. Sem50. Isto do Carnaval ou é o Brasileiro ou é o Brasileiro. Depois está no sangue, está no pé, está na folia, é festa e nisso o Cabo-verdiano aprendeu bem e muito bem com o Brasileiro.

Sem50 - Carnaval? Mas quem falou em Carnaval? Qual Carnaval qual quê?

E. Manuel - Então se não é Carnaval, é o quê?

Sem50 - A sério! Estou a falar da celebração do concelho do Paul, do 8 de Fevereiro meu caro!


E. Manuel - Ahhh!!! Isso...

 

Bom, se dúvidas houvesse, de dúvidas continuo com elas. Ora, neste diálogo, a única não-verdade é o Sr. Sem50, que é uma alusão minha ao Paul dos 150 anos, da qual desconheço qualquer contextualização ou factos, simplesmente porque não os estudei e se o fiz, foi em matéria passageira, ou porque, como Paulenses, não o vivemos e nem sequer está enraizado social e culturalmente no seio quotidiano do Paul de todos nós. Talvez o Carnaval o tenha engolido e ninguém deu-se por isso.

Bom, se é facto que ainda há um Paul entre nós, é ainda mais facto que este Paul já não é o mesmo Paul. Se levarmos em conta os ditos 150 anos, vou dali subtrair os últimos 30, que correspondem à minha geração e,  perguntar aos meus queridos conterrâneos das outras quatro gerações, o que é feito ou foi feito do Paul que todos partilhamos como nosso?

Se me permitem, vou na quinta e última geração, que por sinal é a minha, vou de lá retirar tudo para dizer-vos que eu nada fiz por este meu Paul que agora se vislumbra numa possível extinção, nada fiz para que alguma coisa fosse melhor ou que não fosse pior e, tal como estão as coisas, não vislumbro o que os semelhantes tenham feito também? Sim, não fiz patavina pelo meu Paul, não por não querer, mas porque as circunstâncias não o permitiram. E isso não é desculpa mas sim um facto.

Este emigrado Manuel é um dos muitos emigrados do Paul e de Santo Antão e de Cabo Verde.. Não creio que os emigrados possam contribuir de facto e factualmente para a não extinção da sua terra natal na sua concepção como município/concelho. Não creio que as famosas remessas dos emigrados (nem sei se isso ainda tem o valor que lhe é subentendido) possam ajudar em alguma coisa, de facto.

Um emigrado que deixou as ilhas já passaram dez anos... Um emigrado que só exerceu o seu direito de voto uma única vez em onze anos como eleitor recenseado (ainda que ir a Embaixada é coisa de estadia fora!)... Um emigrado que não contribui com remessas para o seu país... Um emigrado que não tem um papel activo ou uma voz activa (mesmo que distante) na sua comunidade... Um emigrado assim é só mais um emigrado... Emigrados assim há muitos... E, eu sou um emigrado assim... Por isso, Meu Paul, desculpa-me mas parece-me que eu sou pouco teu, porque sou um emigrado assim, porque nada fiz por ti Meu Paul.


Agora, dizem-me que estás no fim, que podes ser extinto e o pior é que estou em crer que essa possibilidade é mais que possível.

Olha Meu Paul, se a coisa da regionalização for avante e se tu nada fizeres, se eu nada fizer, se nós nada fizermos, se continuarmos neste nada de nada, com certeza que vamos ser nada mais do que nada...

Olha Meu Paul, só te cabem cerca de 16% dos habitantes de todo o Santo Antão quando precisavas de uns 25-30% para teres algum peso comparativo na ilha... São uns míseros 1,5% da população de Cabo Verde quando precisavas de uns 8-10% para teres algum peso comparativo no país...

Olha Meu Paul, não consegui ver os teus números, mas os da tua ilha são bem fraquinhos. Só representa uns quantos 6% do PIB nacional... Logo Meu Paul, não deves produzir lá grande coisa...

Olha Meu Paul, como me explicas a excessiva concentração das tuas propriedades cultiváveis em tão poucas famílias? Com certeza que é fruto dos colonatos, lá está, há-mar-mas-não-há-terra para todos...

Olha Meu Paul, lá no INE há uma divisão de Urbanos e Rurais, com certeza que confundiram aquela facção lá no Paul, pois o número de funcionários que trabalha na Câmara Municipal (20%) é deveras similar à percentagem da população urbana do concelho, são 18%...

Olha Meu Paul, há a agricultura, há a pesca e há o teu suposto potencial para ambos. Eu, que não sei praticar nenhum deles, sei que deverias tirar melhor partido em ambos os casos...

Sim, Meu Paul, bem precisamos ter uma conversa séria... A saber o que vamos fazer de hoje diante? A saber como pretendes não desaparecer? A saber o que posso fazer por ti? A saber o que se vai passar contigo? A saber, principalmente, se não está na hora de acordarmos, ainda que 150 anos volvidos?

Sim, Meu Paul, quero que Fevereiro não seja apenas do Carnaval, mas também que seja teu.

Sim, Meu Paul, isto é um diálogo que agora começa. Que começa com uma aceitação do fracasso que são os tais 150 anos.

Sim, Meu Paul, isto é um diálogo aberto, esperemos que não a outro fracasso... 

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